Em duas das telenovelas exibidas atualmente na Globo há tramas paralelas que se passam em escolas: "Mulheres apaixonadas", do autor Manoel Carlos, em reprise no horário vespertino, e "Caminho das Índias", da autora Glória Perez, que estreou há cerca de um mês às 21 horas. É curioso notar a grande discrepância existente entre as duas: são dois retratos absolutamente distintos a respeito do ambiente escolar.
A escola de Manoel Carlos é o local de trabalho dos sonhos de qualquer professor: um rico colégio particular com toda a estrutura necessária, uma diretora compreensiva e dedicada e pais de alunos que comparecem sempre que necessário a qualquer chamado da instituição. Mas o que mais chama a atenção é comportamento dos estudantes, invariavelmente interessados e envolvidos com as aulas e respeitosos para com colegas e educadores, a cujos conselhos chegam a recorrer para solucionar problemas de ordem pessoal. A escola de Manoel Carlos é a escola ideal, que só existe no mundo fictício desse autor e no sonho dos docentes.
Já a escola de Glória Perez é mais parecida com o local de trabalho da grande maioria dos profissionais da educação. Embora não se trate de uma instituição pública e, portanto, seja uma escola com a necessária (e ausente da maioria das escolas) infra-estrutura, há graves problemas aqui. A maioria dos alunos apresenta um comportamente incompatível com o ambiente de estudo. E essa incompatibilidade não advém de conversinhas ou da agitação típica dos adolescentes. O buraco é mais embaixo. O problema está na total indiferença desses jovens para com valores como "educação", "respeito", "civilidade" e "coleguismo". São conceitos inexistentes na mentalidade deles, uma vez que a criação que receberam de seus pais não os incluiu. É uma geração totalmente direcionada para o sucesso individual e material, sucesso que não necessariamente resulta do estudo e da abnegação pessoal, uma vez que há caminhos mais fáceis para consegui-lo. Para que serve a escola então? E os professores, por que ouvi-los e respeitá-los, se o fato de se encontrarem nessa profissão revela unicamente que são fracassados?
O que é realmente terrível na novela é o fato de que os pais do aluno que encarna todos os sintomas da enfermidade social acima descrita posicionam-se sempre favoráveis ao filho e contra a escola e os educadores. Para eles, a culpa é dos professores, que são despreparados, incompetentes e cerceadores da liberdade dos jovens.
Esse comportamento dos pais do Zeca parecia-me um tanto inverossímel. Mas mudei de idéia após ler no blog de Glória Perez uma discussão que se instaurou sob forma de comentários a um post nos quais pais indignados com a autora por estar "demonizando os alunos e santificando os professores" despejam toda a sua revolta contra ela. Exatamente como fazem os pais do Zeca na novela em relação às professoras. Qualquer semelhança não é mera coincidência... Não é à toa que a procura por cursos de licenciatura diminui a cada ano e a crise no sistema educacional só se agrava. Só sendo louco para se aventurar a entrar no verdadeiro caldeirão em que se transformou o ensino: a escola reproduz de modo dramático todos os conflitos e contradições da sociedade, e, por isso, está a explodir.