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segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Uma história de devastação

Ontem andei lendo umas partes do livro Tapera - A caminhada de um povo, organizado e lançado em 1996 pela Secretaria Municipal de Educação de Tapera - RS, minha cidade natal (livro esse que eu já havia lido por inteiro anteriormente.) Algumas partes são extremamente entristecedoras e até revoltantes. Principalmente o que diz respeito à destruição da Floresta de Araucária que cobria a região.

O livro conta que na década de 1930 se instalaram as primeiras madeireiras na região. E em 1950 não havia mais mata para ser derrubada! Uma floresta que era "exuberante" e rica, como o próprio livro diz, e que havia levado séculos e séculos para se formar. E em 20 anos foi arrasada! Não contentes, os exploradores da madeira se transferiram depois para outras regiões, a fim de continuar a extração de madeira. Como verdadeiros sanguessugas... Dá vontade de chorar quando vejo algumas fotos incluídas no livro, que mostram a floresta sendo derrubada e imensas toras de araucária no chão. Que beleza devia ser aquela mata! E nada -nada - nada daquilo sobrou!!!

Na década de 1970, o que ainda havia restado da floresta foi derrubado, com o incentivo do governo militar, agora para disponibilizar mais terras para a monocultura da soja, que acabou com os outros tipos de produção, acabou com os empregos no campo, provocou o êxodo rural, empobreceu o solo, contaminou rios e pessoas com agrotóxicos...

Não há muito de que se orgulhar nessa história de colonização, que merece ser chamada de história de devastação. Nossos antepassados alemães e italianos levaram a cabo uma sucessão de imensos crimes (eu ia usar a palavra "bobagens", mas a palavra é "crimes" mesmo), movidos sempre pela ganância e pelos interesses dos donos do capital. Não era necessário destruir a floresta, embora o livro ingenuamente (ingenuamente?) diga que sim. A produção de subsistência podia ser feita em pequenas áreas, preservando-se grandes partes da mata. A ganância trouxe o desejo de enriquecimento, através da madeira e, depois, das monoculturas. São exatamente esses sanguessugas que hoje dão nomes a ruas, praças, vilas e localidades dentro do município. Mas eles não merecem a glória, não merecem ser chamados de desbravadores, não merecem nada. Foram apenas devastadores. E servem apenas como exemplo do que não deve ser feito... (Sim, são os descendentes desses devastadores que ainda hoje formam a elite pequeno-burguesa da cidade e continuam a devastação...)




E a Amazônia, terá o mesmo destino??... Será sugada até exaurir-se? É triste, mas tudo indica que sim...


A capa do livro, com ilustração de Maria Helena Bervian intitulada Observando a paisagem de Tapera, é perfeita: mostra o vazio quase desértico causado pelas plantações, com as raríssimas árvores que sobraram aqui e ali.

Paradoxos

Agora a devastação no Sul serve para plantar... árvores! É a hora e a vez dos eucaliptos e pínus destinados à indústria moveleira e papeleira(espécies de árvores que, segundo afirmam alguns, deterioram rapidamente o solo, provocando a desertificação)! Paradoxalmente, ESTA NOTÍCIA foi publicada justamente no site de uma associação que promove esse tipo de plantação.

O governo e os empresários locais saúdam a nova frente econômica, como acontece no Rio Grande do Sul, mas os efeitos dos “desertos verdes” de eucaliptos já são sentidos por agricultores na região de Mercedes, no departamento de Durazno.

Será que os atuais sanguessugas de Tapera já descobriram a nova onda?

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

História de uma alma

Hoje, quando acordei, lembrei: 1º de outubro, dia de Santa Teresinha. Nessa data a Igreja celebra a memória de Teresa de Lisieux, essa francesa que viveu no final do século XIX e que se tornou uma santa imensamente popular. Mais que isso: tendo vivido apenas 24 anos e sendo mulher, realizou a façanha de ser proclamada doutora da Igreja, título concedido àqueles considerados como autores de uma doutrina espiritual exemplar. Além dela, apenas duas outras mulheres receberam tal título até hoje: Catarina de Sena e Teresa de Ávila.


"História de uma alma" é o nome que receberam os manuscritos autobiográficos de Teresinha. Sim, ela escreveu uma autobiografia por orientação de suas superioras, no mosteiro carmelita em que passou os últimos anos de sua breve vida. Li o livro pela primeira vez quando tinha 16 anos e, até hoje, lembro dos fortes sentimentos que ele me transmitiu. Teresinha conta detalhadamente sua vida, desde a mais tenra infância, com destaque para a perda da mãe quando tinha apena 4 anos, a relação com o pai e com as irmãs, a viagem a Roma, durante a qual solicitou ao papa que pudesse ingressar na Ordem Carmelita com apenas 15 anos. O livro transborda emoções exacerbadas a cada página, recordações dolorosíssimas, sentimentos elevadíssimos por seus familiares, interpretações sentimentais de cada situação vivida. Só hoje dei-me conta de que Teresinha bem pode ser enquadrada dentro do Romantismo, e é exatamente isso que ela é: uma alma romântica (não por acaso, ela também escrevia poesia...). Será que alguém já escreveu uma tese sobre isso?


A doutrina espiritual de Teresinha chama-se "a pequena via" e, basicamente, consiste em um retorno à simplicidade como meio de ter uma vida espiritual. Ela propõe que a "santidade" seja conquistada através da vida cotidiana, nas atitudes corriqueiras e pequenas, praticadas com amor. O que também não se distancia da visão romântica (e burguesa) da vida.


Hoje Teresinha é pop. Tornou-se a santa das rosas: diz-se que quem faz sua novena sempre recebe, inesperadamente, uma rosa dentro do período de 24 dias em que ela é realizada. A imagem da santa jovem carregando um crucifixo envolto em rosas tem um apelo que atinge desde as crianças até os idosos. Exatamente por isso, vem sendo amplamente utilizada pela Igreja em suas "campanhas publicitárias" desde o início do século XX, tendo sido uma das estrelas do papado João Paulo II, que a proclamou doutora em 1997, quando do 100º aniversário de sua morte. Continuo simpatizando com ela, mas não sei que efeito teria sobre mim uma nova leitura de seus escritos. Talvez eu tenha me tornado demasiado crítico para apreciá-los.

sábado, 2 de agosto de 2008

Leitura diária

Entre os sites indicados pela revista Planeta de agosto em sua seção destinada a esse fim apareceu um que muito me agradou. Chama-se "Leitura diária". O site consiste, basicamente, em um acervo de livros digitalizados. O diferencial é que, nele, pode-se assinar os livros, como quem assina um jornal ou revista. Explico: você escolhe o livro que deseja ler e passa a recebê-lo em partes, com a periodicidade escolhida por você, em seu e-mail. Você pode escolher os dias da semana em que receberá os trechos e o tempo que pretende levar para ler cada trecho. De acordo com o tempo designado por você, o trecho será maior ou menor.
Dessa vez vou ver se leio, com a ajuda do site, um livro que por diversas comecei a ler, mas cuja leitura nunca concluí: "O Ateneu", de Raul Pompéia. História de um menino que vai para um colégio interno e conhece aí a corrupção do mundo e do homem. Escolhi ler 10 minutos diariamente e já recebi - e li - a primeira parte, de um total de 72.


O endereço do site: http://www.leituradiaria.com/


O Ateneu, logo no segundo parágrafo, deu-me uma bofetada:


Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo apenas, igual aos outros que nos alimentam, a saudade dos dias que correram como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em todas as datas. Feita a compensação dos desejos que variam, das aspirações que se transformam, alentadas perpetuamente do mesmo ardor, sobre a mesma base fantástica de esperanças, a atualidade é uma. Sob a coloração cambiante das horas, um pouco de ouro mais pela manhã, um pouco mais de púrpura ao crepúsculo — a paisagem é a mesma de cada lado beirando a estrada da vida.

sábado, 26 de abril de 2008

Um livrinho simpático

Pra quem torce o nariz para os livros de Paulo Coelho, sinto informar que esse texto é sobre um. Aliás, acho uma bobagem esse "torcer o nariz": Paulo Coelho não é um grande romancista, mas há um espaço preenchido por seus livros junto ao público leitor (que nem sempre está atrás de "grandes romancistas"). E o fato de ele ter entrado para a Academia Brasileira de Letras só mostra o quanto essa instituição é incoerente. Mas voltemos ao nosso tema...
"Maktub" é o nome do simpático livrinho (livrinho porque é pequeninho mesmo) que ele lançou em 1994 e que consiste numa coletânea de textos publicados na coluna que ele tinha na Folha de São Paulo. Nesses textos, Coelho apresenta como que parábolas que visam transmitir ensinamentos espirituais. Parábolas que ele coleta nas mais variadas tradições, religiões e filosofias e às quais dá uma roupagem palatável a um público contemporâneo. Assim sendo, o escritor acaba revelando nesse livro seu verdadeiro talento: ele é um compilador, sabe ler e recriar coisas que já foram ditas, que já estão escritas (Maktub: está escrito...).
Quando eu tinha uns 16 anos peguei esse livro na biblioteca de Tapera e gostava de lê-lo e meditar sobre seus textos andando pelos prados abundantes naquela cidade (uma bela cena bucólica!). Semana passada entrei num sebo aqui em Pelotas e havia o livro para vender por 5 reais, então comprei-o. Na primeira página está assinado "Rafael" e datado "19-05-99". Portanto, comprei o livro exatamente 8 anos e 11 meses depois do dia em que seu proprietário anterior assinou-o. Mas, como não sou Paulo Coelho, não sei o que isso significa...

Agora vou abrir o livrinho ao acaso e copiar aqui o texto correspondente à página em que eu abrir:


Uma lenda do deserto conta a história de um homem que ia mudar-se de oásis, e começou a carregar seu camelo. Colocou os tapetes, os utensílios de cozinha, os baús de roupas - e o camelo aguentava tudo.Quando ia saindo lembrou-se de uma linda pena azul que seu pai tinha lhe presenteado. Resolveu pegá-la, e colocou-a em cima do camelo. Neste momento, o animal arriou com o peso, e morreu."Meu camelo não agüentou o peso de uma pena", deve ter pensado o homem. Às vezes pensamos o mesmo do nosso próximo - sem entender que nossa brincadeira pode ter sido a gota que transbordou a taça do sofrimento.

(COELHO, Paulo. Maktub. Rio de Janeiro, Ed. Rocco, 1994, p.178)

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

O poder da narrativa em "O jardim secreto"

Escrito dentro do espírito do Romantismo, “O jardim secreto” (1912), de Frances Hodgson Burnett, apresenta como uma de suas questões centrais a transformação pela qual suas personagens principais passam ao longo da diegese, a partir da reconstrução que fazem das narrativas sobre si próprias. De uma situação inicial caracterizada pelo sofrimento, pela solidão e pela apatia, elas são guiadas pelos acontecimentos narrados a uma nova condição, marcada pela plenitude. Assim, a garota Mary Lenoxx, que, após a morte de seus pais na Índia, vai morar na imensa e escura casa de seu tio na Inglaterra, sai pouco a pouco de uma existência ensimesmada e passa a se aproximar das pessoas e a compreendê-las, bem como ao mundo que a rodeia. Da mesma forma, o garoto Collin, primo de Mary que nunca saía de seu quarto por julgar-se inválido e enfermo, acaba por descobrir-se saudável e cheio de vida. E também o Senhor Craven, tio de Mary, que após a morte de sua esposa tornara-se um homem amargurado e fechado em si mesmo, descobre razões para voltar a sorrir. Mas que acontecimentos são esses, capazes de desencadear tais metamorfoses?
O episódio central da narrativa consiste na descoberta, por Mary, de um jardim que estava fechado e abandonado havia 10 anos, desde a morte de sua dona, a esposa de Craven. Ao entrar no jardim, ela vê que o abandono o havia deixado à beira da morte. Com a ajuda de Dickon, irmão de uma das criadas da mansão, que encarna o espírito romântico em seu modo de viver plenamente livre e em harmonia com a natureza, ela passa a cuidar do jardim, que volta a florescer com vigor total. Paralelo ao desabrochar do jardim, ocorre o desabrochar de Mary: o contato com a natureza e com as pessoas muda-lhe o comportamento, a personalidade e até mesmo a aparência. A descoberta do jardim faz com que Mary olhe para fora de si mesma, vendo que há outras coisas além do interior daquela casa sombria e outras pessoas além de si própria. O imaginário de Mary vai, aos poucos, sendo preenchido por novas idéias e novas possibilidades, permitindo que ela reescreva a narrativa que havia sido escrita pelas outras pessoas sobre ela e que ela havia aceitado como sendo verdadeira: de que ela era uma menina feia e antipática, de que ninguém gostava dela e de que ela estava condenada à solidão e ao esquecimento.
A presença da “narrativa dentro da narrativa” é uma constante ao longo de todo o romance. Embora o romance seja construído através de um narrador em terceira pessoa, suas personagens estão a todo momento narrando coisas: episódios, cenas reais, imaginadas ou recriadas pela imaginação, a respeito de si próprias ou de outrem, que elas contam umas às outras e que movem, em grande parte, a narrativa do próprio romance. Elas revelam-se quase como co-narradoras, tamanha é a importância da voz que lhes é conferida. Na verdade, é por meio dessas narrativas que as personagens parecem tomar contato com o mundo que as cerca e com as outras pessoas. Assim, o conteúdo de tais narrativas acaba por determinar seus comportamentos. É o que ocorre com o garoto Collin: todos sempre haviam falado que ele era doente e não viveria muito tempo, as pessoas comentavam que ele se tornaria corcunda e inválido, e ele aceitava como verdade essa ficção criada sobre ele, a ponto de viver fechado em seu quarto, sem sair da cama ou ver a luz do sol. Até o dia em que ele é descoberto por Mary, sua prima, que já havia descoberto o jardim, e que vai povoar o imaginário do menino com elementos novos, com um mundo de vida e cores ao narrar para ele todas as suas descobertas. Mary introduz Collin num processo semelhante ao que ela já havia vivido: leva-o a vislumbrar o novo, a abrir os olhos diante do mundo e a reescrever sua própria história.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Lunático V (Espiritualizado)

"Espiritualmente falando, a lua decrescente serve para arrancar as ervas daninhas, limpando o terreno com vistas à semeadura na lua nova, ao crescimento na lua crescente e à colheita abundante na lua cheia." *


* Marisa Varela, A gruta do Sol 2, Editora Misão Órion, 1998, p. 209

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Um livro diferente


Fala de reencarnação, planos astrais, vidas passadas e futuras, mas não é um livro espírita! Não é um grande best-seller, nunca o vi nas listas de mais vendidos, mas teve várias edições e até uma continuação. E, para completar, é um livro de 315 páginas, todinho impresso na cor violeta (igualzinho a esse post)!
Estou falando de "A gruta do sol", de Marisa Varela (Editora Nova Fronteira, 1991. A edição que possuo, a sexta, é de 1995).
Conheci esse curioso romance há mais de 10 anos, quando eu ainda cursava o Ensino Médio e estava numa fase de grande interesse por temas esotéricos, místicos e espirituais. Encontrei-o na biblioteca de meu colégio e o li de cabo a rabo mais de uma vez. Recentemente, reencontrei-o no Mercado Livre e o comprei. E, para minha grande surpresa, fiquei sabendo da existência de "A gruta do sol 2" (este, da Editora Missão Órion, 1998), que comprei também e cuja leitura ainda não terminei.
A história do romance gira em torno de Daniel, que conhecemos ainda menino e vivendo no Rio de Janeiro com seus pais. Ele teria uma vida semelhante à de qualquer criança, se não fosse sua intensa "vida espiritual". Durante o sono, sua alma faz viagens aos planos astrais elevados, onde ele vive experiências fantásticas, conhece os Mestres Ascensos e fica sabendo ser ele um ser altamente evoluído, que está em sua última encarnação na Terra. Todas essas experiências vão aos poucos modificando a "vida real" de Daniel, determinando seus comportamentos e suas escolhas, e, por conseguinte, seu futuro.
São evidentes as intenções da autora de usar o romance para transmitir ensinamentos espiritualistas, baseados nos ensinamentos da Grande Fraternidade Branca. Isso, no entanto, não a impede de construir um romance atrativo e palatável mesmo por quem não tem o menor interesse por tais ensinamentos. O narrador que ela constrói, o próprio Daniel, é bastante interessante e sabe levar sua história com talento o suficiente para ganhar o leitor. O livro tem momentos bastante dramáticos, mas outros repletos de bom-humor e ironia. Nem mesmo a narração dos acontecimentos espirituais vividos no plano astral tem o efeito de afugentar o leitor, pois acaba tendo sabor de ficção fantástica, no estilo "O Senhor dos anéis".
Marisa Varela está anos-luz à frente dos escritores espíritas que disputam as prateleiras das livrarias e as listas dos mais vendidos. Demonstra erudição e conhecimento do que vem a ser literatura, coisa que parece ser ignorada pelos "Gasparetto" da vida... Talvez seu ínico erro seja não ter grandes conhecimentos de marketing, pois seus livros tinham tudo para virar fenômeno de vendas.