quinta-feira, 27 de março de 2008

Revista Destino

Já escrevi uma vez sobre a Revista Planeta, da qual sou leitor desde longa data, e da qual até posto algumas matérias antigas aqui. Hoje vou falar de uma outra revista que eu lia e da qual coleciono números antigos.
Sim, apenas coleciono números antigos, pois a revista Destino não existe mais. Deixou de ser publicada nos anos 90, acho que em 1997 ou 98. Pertencia à Editora Globo e durou menos de 10 anos. Era voltada a assuntos místicos e esotéricos, e representava uma espécie de meio termo entre a Planeta, que era mais profunda e "erudita", e outras revistas popularescas, como as editadas pelo João Bidu. Asim, a Destino trazia tanto os horócopos e previsões mensais quanto matérias (não muito profundas, é verdade) sobre assuntos como religiões, magia, ufologia. Na verdade, a Destino acompanhou a grande onda esotérica do final dos anos 80 e dos anos 90, em que se sucediam vários modismos "místicos": teve a época dos gnomos e elementais, a época dos anjos, a época das bruxas e magos, a época do feng shui.



Capa da edição 49, de junho de 1993

A primeira edição de Destino que comprei foi a número 97, de junho de 1995 (eu não tenho mais essa edição e queria muito reencontrá-la. Se alguém tiver e quiser me vender, eu compro!) E a partir de então comprei quase todas as edições, que eram quinzenais, até o final da publicação. Infelizmente, por uma dessas atitudes bestas da vida que outro dia comentarei, desfiz-me da coleção. A Destino era uma excelente revista de divulgação, ou seja, suas matérias podiam não ser muito profundas, mas serviam para divulgar temas, práticas, livros, escritores sobre os quais dificilmente se ouvia falar em outros canais. Assim, ela despertava o interesse por coisas nas quais depois, quem quisesse, podia buscar se aprofundar. E esse era seu mérito. Ultimamente tenho adquirido vários exemplares da Destino em sebos e sites de vendas. Nem tanto pelo conteúdo, mas pela lembrança de uma época nem tão longínqua, mas muito diferente dessa atual. Sobretudo, uma época em que eu próprio era muito diferente. Uma época em que eu tinha mais pureza e, quase, ingenuidade. Uma época em que o mundo parecia um grande portal para um Universo mágico: a qualquer momento poderia aparecer diante de mim um Mago, um duende ou um anjo e revelar-me maravilhas do mundo de onde ele tinha vindo.

terça-feira, 25 de março de 2008

Inveja dos mais jovens

Todo adulto tem inveja dos mais jovens.
Essa frase está na canção Aloha, da Legião Urbana, no álbum A tempestade, de 1996. Eu ouvi muito esse álbum quando era adolescente e, nessa época, sendo eu muito jovem, não compreendia o que o Renato Russo queria dizer com aquilo. Hoje acho que compreendo.
Não que eu seja velho. Mas, com 27 anos, já invejo esses pirralhos que hoje têm 16, 15, 14... E os invejo principalmente por uma coisa à qual eles têm acesso e que eu, com a idade deles, não tinha: a internet.
Ah, se quando eu tinha a idade deles eu tivesse a meu dispor esse universo de possibilidades que é a internet! Quanta coisa teria sido diferente para mim! Principalmente pra quem tem sede de saber e pra quem é solitário, a internet é uma dádiva dos deuses. E eu tinha essas duas características.
Lá naquela cidadezinha em que eu morava, era nas bibliotecas e nas bancas de revistas que eu buscava alimentar meu espírito, com alimento nem sempre abudante. Hoje, qualquer coisa que se queira saber está disponível por aí... É só procurar um pouquinho, perguntar para o deus Google, e tudo nos é revelado num piscar de olhos.
E naquelas noites silenciosas, como me pesava a solidão de não ter uma alma semelhante à minha por perto! Se havia, eu não a conhecia, o que dava no mesmo. Eu trocava correspondência com pessoas de longe, por meio de anúncios publicados em revistas, e era esse o modo como estabelecia contato com pessoas parecidas comigo. Mas cartas levam dias, semanas para chegar. Eram lidas e relidas, e não tinham a força do tempo real, dessa companhia à distância milagrosa que nos é oferecida pelo msn, pelo orkut e por outros recursos vistuais.
Ah, se a internet tivesse chegado quando eu tinha 15 anos! Tenho certeza absoluta de que minha vida teria tomado outros rumos e de que muitos sofrimentos me teriam sido poupados. E é por isso (e por outros motivos) que, sim, tenho inveja dos mais jovens...

segunda-feira, 24 de março de 2008

O Papa (O Sumo Sacerdote)


Este Arcano é a contraparte masculina da Papisa, a sabedoria feminina da intuição e dos aspectos menos conhecidos da psique. Enquanto sabedoria masculina, o Papa aponta para a Razão, a inteligência em sua face mais profunda, o Mestre Interior que surge como verdadeiro guia de cada um de nós em nossas decisões e em cada ato de nossa existência.
Ele aponta para a necessidade de ponderação, de reflexão, a fim de que sejam evitadas atitudes impensadas. Ao mesmo tempo, ele nos incita a reconhecermos a sabedoria advinda de fora, seja de outra pessoa, seja de um sistema de idéias, da Ética, do Inconsciente Coletivo, ou de um sistema espiritual. Ou seja, incita-nos à humildade necessária para reconhecermos que nem sempre temos todas as respostas. Às vezes é preciso buscar uma resposta em nosso interior, através da meditação, da oração, do silêncio. Às vezes, também, é preciso escutar as vozes que vêm de fora e reconhecer nelas a orientação que nos é necessária.

sábado, 22 de março de 2008

Vislumbrando dias outonais


Sê bem-vindo, Outono!

Traz contigo a beleza daqueles Crespúsculos que só durante Teu reinado nos é concedido contemplar.

Traz contigo a beleza do límpido céu noturno.

Traz contigo a doçura do anoitecer que chega cada vez mais cedo.

Traz contigo a suavidade das temperaturas amenas que convidam ao recolhimento, à introspecção.

Traz contigo, após a eufórica dissipação do Verão, o retorno ao Lar: o lar de nossa casa e o lar de nosso coração.

Sê bem-vindo, Outono!

Ainda não te sinto, mas sei que vens, pois "eu já escuto os teus sinais".

quarta-feira, 19 de março de 2008

Mabon - Equinócio De Outono


Hoje é o último dia do verão, dia do Equinócio de Outono (no Hemisfério Sul), em que dia e noite têm igual duração, mas a partir do qual as noites crescerão e os dias diminuirão. Na antiga religião de culto à Deusa Mãe e à Natureza, essa data corresponde ao fetival de Mabon, que comemora a abundância e a prosperidade, encerrando o período de colheitas. É um dia de gratidão e comunhão com a Natureza por sua generosidade.

Particularmente, eu sinto a energia dessas festividades que, de alguma forma, correm em minhas veias nos genes que me vieram de meus ancestrais europeus. Hoje, de forma até inconsciente, abasteci a geladeira de frutas e cerveja. Olhei para o céu e vi uma majestosa brincadeira entre o Sol e grossas nuvens, com efeitos de luz e cores muito interessantes. E foi então que lembrei do equinócio. Mais tarde vou celebrá-lo, assando um pão, oferecendo um pouco de cerveja a meus ancestrais, acendendo velas e incensos e tocando a terra com meus pés.

É preciso celebrar para estar vivo. Celebrar, para mim, é comungar com a Natureza.

segunda-feira, 17 de março de 2008

A favor do Tibete


Deu na Folha Online:



E a repressão aos protestos, pelo que se diz, foi violenta e já está provocando ampla repercussão mundial.
É triste ver o que acontece nessa região onde floresceu uma das culturas mais singulares da humanidade, com toda a sua riqueza espiritual. Assim como é triste ver que o país que desponta como nova potência mundial, a possível sucessora dos Estados Unidos, demonstra que, se essa substituição dos EUA pela China de fato se confirmar com o tempo, talvez hajam poucas mudanças no que se refere ao belicismo e ao imperialismo. A China revela-se ao mundo como repressora e ditadora, e o controle à informação através do bloqueio a sites da internet é só mais uma face dessa postura. O pior de tudo são as tentativas de erradicar da face da terra a identidade cultural tibetana, cerceando a liberdade de expressão, controlando os monges e a religião do Tibete e impondo os padrões culturais chineses aos tibetanos. Não entro na questão geopolítica ou no debate sobre se o Tibete pertence por direito à China ou não, embora me pareça estranho que uma região com uma identidade cultural tão forte e uma história tão própria forme uma unidade com a nação chinesa...
No meio de tudo isso, soam extremamente sábias as palavras do Dalai Lama ao denunciar que está um curso o que ele chama de um "genocídio cultural": a cultura do Tibete corre perigo, e todas as nações deveriam se unir em prol dela nesse momento.



domingo, 16 de março de 2008

A Estrela


Semana passada foi o obscuro arcano da Lua quem se apresentou. Hoje, é o luminoso e colorido arcano XVII, A Estrela, quem se nos apresenta. A lâmina é por si mesma encorajadora: a estrela é sempre um signo de orientação, de beleza e esplendor. Aqui, ela aparece como uma celebração da vida e do universo em sua perfeição.
O corpo humano, na nudez da mulher, é símbolo, ao mesmo tempo, de nossa integração ao Cosmos e de nossa majestade, presente no azul real de seus cabelos. A mulher derrama a água de duas jarras, uma sobre uma fonte de água e outra sobre o solo. Esvaziando as jarras, ela se desfaz das dualidades ilusórias que cercam a humanidade: corpo e alma, emoção e razão, masculino e feminino, sagrado e profano... A pessoa harmonizada com o Universo triunfa de toda dualidade. À sua volta, estende-se a terra, onde brotam e florescem as plantas, símbolo da vida.
Esta carta aponta para vitórias, o encontro de soluções após aparentes derrotas, a organização e a clareza dos pensamentos após a confusão mental, a ajuda e a orientação após o tropeço, um caminho iluminado após a depressão. Que nessa semana que se inicia brilhe em cada um de nós a luz benfazeja dessa linda Estrela.

sexta-feira, 14 de março de 2008

O sagrado e o profano

(Texto dedicado às pessoas que chegam a este blog através do Google, buscando pelas palavras-chave "sagrado e profano" ou semelhantes.)


O sagrado e o profano são conceitos de enorme importância social. A força que se encontra por detrás deles é capaz de definir padrões comportamentais aceitos, relegando outros à marginalidade. No entanto, ou justamente por isso, são noções extremamente flutuantes, variando de acordo com o tempo e o espaço.


Sagrado
:
do Lat. sacratu
adj.,
relativo aos ritos ou ao culto religioso;
que foi consagrado;
profundamente venerável;
puro;
santo;
a que se deve o maior respeito;
inviolável;
s. m.,
aquilo que é sagrado;
prov.,
adro da igreja;
o chão do cemitério.
do Lat. profanu <>
não pertencente à religião;
não sagrado;
leigo, secular;
mundano;
não iniciado em certos conhecimentos;
estranho a certos assuntos;
ignorante.


Se é certo que se tratam de dois universos opostos, também não se pode negar que um só é compreensível em relação ao outro. Afinal, como entender que algo é puro e santo, sem a noção do que é impuro e mundano?
Na definição de ambos os conceitos, o fator religioso ocupa papel central. É da crença religiosa, da relação com o sobrenatural e, em última instância, dos próprios deuses, que advém o caráter sagrado de certos atos, objetos, lugares e indivíduos. Por outro lado, é da oposição ao transcendental, da negação ou da afronta a ele, que provém a profanidade de outros atos, objetos, lugares e indivíduos.
Mas é sobretudo o aspecto social que interfere na formatação do sagrado e do profano no imaginário da coletividade. As relações de poder, o modo de produção e a distribuição dos bens materiais e culturais valem-se desses dois conceitos para obter para si próprios a legitimação, a aceitação e a perpetuação. Exemplo clássico disso é o caráter sacro atribuído a si próprias pelas antigas monarquias: enquanto representante de Deus, o rei era sagrado e inquestionável. Rebelar-se contra ele seria uma profanação.
Se em nossos dias o pensamento religiosos perde a força de persuasão e os conceitos de sagrado e profano já não falam com tanta força ao homem contemporâneo, fica a questão: que outros conceitos ocupam hoje seus lugares? Será a idéia de "científico" oposta à de "não-científico" a versão moderna do sagrado e do profano?

quinta-feira, 13 de março de 2008

Quem foi Caim?

Matéria publicada na Revista Planeta, Número 193, de outubro de 1988

Existem duas maneiras de se ler a Bíblia, o livro sacro das religiões cristã e judaica. Uma é aceitando, sem pensar ou discutir, tudo o que está lá registrado. A outra consiste em tentar compreender o que os autores estão procurando transmitir, por vezes de forma simbólica. Para isso, torna-se necessário descobrir o contexto histórico e muitos outros detalhes pertinentes ao assunto. Essa é a forma usada por Planeta para esclarecer trechos obscuros - como os que envolvem a história de Caim, aqui abordada.

Por Elsie Dubugras

A primeira coisa que as pessoas deveriam saber quando lêem a Bíblia é que ela não constitui um só livro, mas sim um conjunto de livros, cujos autores foram homens de diferentes níveis sociaias e culturais. Além disso, o conjunto cobre diversos séculos e os livros foram escritos em três línguas diferentes: o hebreu, o aramaico e o grego. Outro detalhe importante é que algumas histórias não se referem a pessoas da época em que foram escritas: os fatos podem ter sido extraídos de mitos ou lendas antigas de outros povos.

Por estes e outros motivos, nunca foi fácil entender e interpretar corretamente o conteúdo desse importante livro de fundo religioso, e isso levou as pessoas interessadas em conhecer a verdade a instituir um método de exegese bíblica conhecido pelo nome de Midrash, que procura o espírito de um trecho e não uma interpretação ao pé da letra (Encyclopaedia Britannica, pág, 416)

Para se ter uma idéia da importância do Midrash, basta ler um pequeno trecho do primeiro livro da Bíblia - a Gênese, que trata da formação da Terra, da criação das duas primeiras criaturas humanas (Adão e Eva), de sua expulsão do Paraíso e de seus dois filhos (Caim e Abel). Motivado pela inveja, Caim mata Abel, assassinato este que deixou um saldo de três habitantes na Terra (Gên. 4:1/8) - isso se o trecho bíblico for interpretado ao pé da letra.

Caim mata Abel, na visão do pintor italiano Tintoretto


Vamos começar observando o que acontece com Caim, o fatricida. De início, quando o Senhor cientifica-se de que Caim matara Abel, Ele o amaldiçoa (Gên. 4:9:12); mas de súbito, sem motivo aparente, a atitude do senhor modifica-se: a maldição cairá sobre quem matar Caim e, para resguardá-lo desse perigo, Deus põe um sinal em Caim "para que não o ferisse qualquer que o achasse" (Gên. 4:15).

Devidamente protegido por aquele sinal, Caim "saiu de diante da face do Senhor, e habitou na terra de Node, da banda do Oriente do Éden. Lá ele conheceu sua mulher, e ela concebeu, e teve Enoque: e ele edifivou uma cidade, e chamou o nome da cidade pelo nome de seu filho Enoque." (Gên. 4:16/17)

Como entender, em primeiro lugar, essa mudança na atitude do Senhor, que chegou a premiar Caim com um sinal para protegê-lo de possíveis inimigos? Segundo alguns exegetas, o capítulo 4 da Gênese poderia estar narrando a história de duas pessoas diferentes, mas com o mesmo nome, e as histórias teriam sido emendadas à altura do versículo 15. Se esse fosse o caso, tudo ficaria mais claro, pois um relato seria do fatricida Caim e o outro de uma pessoa que poderia ser um sacerdote encarregado das execuções sagradas. O primeiro seria amaldiçoado, maso segundo, que teria participado de um ritual religioso para beneficiar a comunidade, não poderia ser castigado. Após a cerimônia em que sacrificara uma vítima, ele teria de ficar algum tempo afastado da convivência do povo, ou seja, em algum lugar deserto, e lá se purificar. Paraficar protegido doi ataque de possíveis inimigos, o executor sagrado levaria consigo um artefato comprovando que tomara parte naquela cerimônia. O artefato lógico seria o borrifador por ele usado para aspergir as pessoas com o sangue da vítima sacrificada.

Em Números 19:6, há uma descrição desse borrifador e dos materiais usados para construí-lo: "E o sacerdote tomarápau de cedro, o hissopo e carmesim (...)." O hissopo era uma planta ideal para o fim que se tinha em vista, pois geralmente não alcançava mais do que 25 cm de comprimento, era elíptica e tinha folhas pequenas. Segundo a tradição dos judeus, o cedor e o hissopo eram amarrados com um fio vermelho de lã (carmesim) também conhecido como língua vermelha.

Quanto aos sacrifícios humanos, o ato de executar uma vítima não seria condenado, pois, como já dissemos, o ritual religiosos tinha por fim beneficiar a comunidade junto aos deuses e, naquele tempo, acreditava-se que o sacrifício de um ser humano aplacava a ira dos deuses e afastava os danos que ela poderia causar. Contudo, havia ainda outro motivo, e esses era o mais curioso de todos: sacrificando uma pessoa, a comunidade estaria enviando um mensageiro ao plano espiritual, e lá esse emissário poderia interceder junto aos deuses para conseguir os favores que a comunidade desejasse.

As formas usadas para a prática de tais sacrifícios eram diversificadas e nem sempre obedeciam a um ritual religioso. Por exemplo, a fim de dar umacerta legitimidade ao ato, simulava-se uma luta entre duas pessoas e, se esse fosse o caso, é provável que a própria vítima houvesse concordado, antecipadamente, em sacrificar a sua vida.

Outra variante seria um combate gladiatório entre prisioneiros inimigos, e o que perdesse a luta e viesse a morrer seria a vítima a ser oferecida como sacrifício aos deuses.

É possível que, no caso de Caim, tenhamos ainda outra explicação: a de que a cerimônia em que o executor sagrado estava envolvido seria semelhante àquela usada no ritual do Bode Expiatório, praticadopelos israelitas no Dia da Reconciliação. Nessa cerimônia, dois bodes seriam usados, e a escolha da vítima feita por sorte (Lev. 16:8) "E Arão lançara sorte sobre os dois bodes: uma sorte pelo Senhor, e a outra sorte pelo bode emissário." Um bode então era savrificado e o outro, o que a Bíblia chama de emissário, enviado ao deserto. (Lev. 16:10) A forma como isso era feito está descrito nos versículos 21 e 22 do memo Livro.

Quando a finalidade do ritual era a cura e a purificação dos leprosos, os pássaros substituíam os animais comumente sacrificados. Duas pombas eram usadas; o sacerdote imolava uma e aspergia os leprosos com seu sangue. Isso era repetido por sete vezes. Em seguida, ele mergulhava a pomba emissária no sangue de sua companheira, e a soltava num campo aberto.

Deus: primeiro castiga Caim; mas depois protege-o dos inimigos.
("A criação dos animais", Tintoretto)

Como se vê por esses relatos, o sangue da vítima era um fator importante em tais cerimônias.Qual seria a razão? Porque o sangue é considerado a força vital, tanto do homem como do animal, e quando, por meio de rituais, a energia que ele representa é devolvida aos deuses, todos se beneficiam, pois a aspersão com sangue restabelece o pacto sagrado com Deus. Assim sendo, parece lógico que o executor sagrado, ao retirar-se para um lugar deserto, levasse consigo o borrifador de sangue com o qual ele teria aspergido a comunidade.

Passemos agora a outros aspectos relativos ao nome Caim. Ele poderia não ser um nome próprio, mas a indicação de uma profissão. Neste caso, Caim poderia significar alguém que trabalhasse com metais: um ferreiro, por exemplo. Também poderia ser o nome de uma tribo. Poderia, então, ser a dos queneus, cujo fundador foi um homem chamado caim e de quem a tribo descendia. São suposições que exigiriam um espaço maior para serem explanadas.

Para encerrar o estudo desta parte mínima da Bíblia, vamos retornar ao capítulo 4 da Gênese. Lá, lemos que Caim viajou para o Oriente após receber o sinal de proteção do senhor, estabelecendo-se num lugar chamado Node, onde encontrouuma mulher; teve um filho com ela e iniciou uma longa descendência que vai até a época do Dilúvio, além de fundar uma cidade. Deduz-se que foi durante este período que Adão e Eva tiveram outro filho, que chamaram Sete. Este, por sua vez, Deixou outra descendência através de seu filho Enos (Gên, 4:25/26)

Quem seriam os habitantes de Node, onde Caim encontrou sua mulher? Onde aprendera ele a construir casas e até estabelecer uma cidade? E onde Sete achou a sua esposa? Para explicar esses fatos conflitantes, recorremos aos exegetas e ao livro de Hyam Maccoby, The Sacred Executioner (Thames and Hudson). Diz Maccoby que o nome Adão não se refere a uma pessoa em particular. Significa humanidade e foi inserido na Bíblia por razões ideológicas: os compiladores israelitas desejavamestabelecer uma genealogia comum a todos os povos. Com esta explicação, o resto - que antes era incompreensível - torna-se lógico. Se Adão significa humanidade, é natural que existissem seres humanos em diversos lugares, e Node seria um desses lugares. E foi em Node que caim - o executor sagrado - e possivelmente Sete, seu irmão, encontraram suas esposas.

domingo, 9 de março de 2008

A Lua


O Arcano XVIII do Tarô, A Lua, é um arquétipo do inconsiente humano, aquela parte de nossa natureza que fica oculta na maior tempo e que só vem à tona por meio de uma luz refletida, os lampejos que a consciência lança esporadicamente sobre ela. Nessa parte de nosso ser residem nossos instintos, nossa energia caótica e pulsante, que pode conduzir-nos tanto a realizações sublimes quanto à destruição. Não por acaso, é durante a noite, através dos sonhos, que mergulhamos nesse mundo regido pela Lua.
Ao mesmo tempo, a Lua nos fala de instabilidade, de provisoriedade. Ela muda constantemente em seu eterno ciclo através das 4 fases, e, assim como muda sua aparência, altera também sua influência sobre a terra e sobre os homens.
O inconsciente e os instintos precisam ser controlados, precisam estar a serviço do indivíduo e não contra ele. Para isso, é necessário atravessar o lago das emoções, vencer o monstro aquático que aí se aloja, para depois ainda lutar contra as duas feras caninas que guardam o acesso à cidade sobre a qual a Lua reflete sua luz.

A Lua é sempre um alerta contra as ilusões em qualquer aspecto da vida humana e um convite ao auto-conhecimento e à investigação da verdade que se esconde por detrás das aparências.
Nessa semana, o Tarô lhe convida a esse processo, caro leitor, e é por isso que você está lendo, agora, esse texto. Numa evidência da sincronicidade, estamos na Lua Nova, fase em que ela oculta-se no Céu. Oculta no Céu, ela quis aparecer aqui, a mim e a você...

sexta-feira, 7 de março de 2008

Selinhos

Não, não é um post sobre a Hebe nem sobre bitocas e, sim, sobre selos que recebi de outro blog.
O Johny Farias, autor do blog "Humano, por enquanto" resolveu oferecer-me novamente os selos que merecidamente recebeu. E dessa vez vieram vários ao mesmo tempo (ter amigo famoso e generoso é pra quem pode...).

Vou repassá-los para:

O blog "Ab tempore", da minha amiga Franciele, como incentivo para que ela continue com ele e o atualize!

O "Caminho do Meio e Avessos", de Sininho, com o qual identifiquei-me à primeira lida.

O gostoso "Sabor de cereja", de Ana e outras "cerejas".


Parabéns aos três e muito obrigado ao Johny pela generosidade e lembrança!!!

P.S. Postei o texto e esqueci de colocar os selos, hehehe... Aí vão eles agora:

quinta-feira, 6 de março de 2008

Os Rastas

Matéria publicada na Revista Planeta, número 150, de Março de 1985

Para muitos, o falecido imperador etíope Hailé Selassié foi apenas mais um curioso exemplar entre os governantes que assolam os paises do Terceiro Mundo. Outros, porém, viram nele o messias, e em sua terra, a origem do cristianismo: são os rastas, da Jamaica, adeptos de uma singularíssima religião que se tornou internacionalmente conhecida a partir das músicas de nomes como Bob Marley.

Por Otávio Rodrigues

Negros. Enormes tranças em desalinho, escorrendo pelo corpo ou sob toucas de lã colorida. Na mão, provavelmente, um grosso cigarro de marijuana, e no prato, frutas, hortaliças e raízes. Os gestos são vagarosos, o olhar é sereno e o bom humor, uma constante. Cultuam a imagem do ex-imperador etíope Hailé Selassié, “o messias”. Clamam pela volta à África, de onde seus ancestrais foram cruelmente arrancados durante o período escravagista. A Bíblia, leitura diária, ilustra os cânticos ao lado de críticas ao sistema, “a Babilônia”, numa inebriante cadência dos tambores. Embora extremamente avessos a qualquer tipo de opressão e, por vezes, agressivos nessa situação, mantêm-se generosos e receptivos a todos indistintamente. Crêem na vitória do bem sobre o mal e na vida eterna, pregando e praticando a máxima “paz e amor”. Cenário: Jamaica; cores: vermelho, amarelo e verde. São os rastas. (1)
O movimento (2) rastafari surgiu com a coroação de Hailé Selassié, em 1930. Através da música popular jamaicana, o reggae, ganhou notoriedade internacional na década de 70 e arrebanhou seguidores em todo o mundo. Aquilo que outrora era “a vergonha da Jamaica” – indivíduos de “péssima aparência”, hábitos “criminosos” – tornou-se repentinamente um atrativo para visitantes, que fazem do turismo a segunda maior fonte de renda do país. Isso, no entanto, não os poupa dos constantes problemas com a polícia, que os toma por vadios e drogados. O certo é que o rastafari possui elementos de grande interesse. Não obstante o etnocentrismo de alguns observadores, que os tacham de loucos e alienados, os rastas conquistaram uma identidade, dentro e fora da Jamaica. Seus anseios extrapolam a esfera espiritual e ganham, paulatinamente, força social e política.
É corrente a afirmativa de que o sistema escravagista implantado na Jamaica foi um dos mais cruéis em todos os tempos. Os primeiros escravos chegaram à ilha em 1509; eram primordialmente trazidos para o trabalho nas plantações de cana-de-açúcar, que sustentaram a economia européia nos séculos XVII e XVIII. Capturados na costa da Guiné, Congo, Angola e Sudão, pertenciam a grupos tribais importantes, como os coromantees, achantis, mandingas, fantis, dagombas, mamprusis e talenses. Isolados entre si na África, sem intercâmbios, fundiram suas tradições e culturas no Caribe, descobrindo-se como um só povo, partilhando dos mesmos sofrimentos. (3) Os coromantees possuíam tradição guerreira, que os fazia rebeldes e violentos; foram a espinha dorsal dos maroons, escravos fugitivos e de atribuições míticas, que se concentraram no interior da ilha, onde estão até hoje. Arredios, não se misturam à civilização jamaicana. Garantidos por lei, seus territórios preservam as tradições tribais africanas de seus primeiros. É cabível afirmar que os núcleos maroons são uma espécie de quilombos que deram certo. Oliver Cromwell, a serviço da Coroa Britânica, conquistou a ilha em 1655. Suas incursões ao Caribe garantiram à Inglaterra o domínio de importantes colônias até então sob jugo espanhol.



O imperador etíope Hailé Selassié, "Senhor dos senhores, Rei dos reis!

Os homens de coração negro

A Jamaica é um caso singular no que diz respeito à tradição e folclore. Ao contrário de outros sistemas escravagistas, os negros não eram forçados a adotar a cultura européia. Os ingleses possuíam objetivos unicamente mercantilistas, não se importando com qualquer tipo de catequese ou ensinamento. Os escravos, por sua vez, erigiram uma cultura toda própria, fruto da miscigenação tribal a que foram submetidos. Os trabalhos nos campos eram ritmados com canções africanas, do tipo chamada-resposta, que, segundo os ingleses, aumentavam a produtividade.
As primeiras práticas religiosas foram o myalism e o obeah, ambos herança africana, misturando exarcebado culto aos mortos, voduísmo e curandeirismo. Outras expressões foram a kumina e o junkunnu, que vingaram até hoje. A primeira, tida como um dos mais antigos cultos afro-caribenhos, está bastante ligada ao myialism. Suas funções incluem a possessão espiritual, o bater frenético de palmas e o ritmo dos tambores. O junkunnu é a mais tradicional festividade jamaicana, com muita dança, música, teatralização e paródia.
Arraigados em suas tradições e ritmos, os negros jamaicanos atravessaram quase três séculos imunes à cultura e religião brancas. Um lei de 1774, entretanto, levou várias práticas de seu folclore à condição underground. Os patrões conscientizavam-se do perigo em permitir vários escravos unidos, em comunicação constante. Era o fim de um ciclo.
Com o confinamento das práticas religiosas de descendência estritamente africana, criou-se um vazio espiritual na Jamaica. As cerimônias da igreja tradicional eram frias, nada diziam aos escravos. Em 1784, Geoge Liele, afro-americano e ex-escravo, fundou a Igreja Batista na Jamaica. Gradativamente, atraídos pelo discurso acessível dos novos sacerdotes, os negros tomaram contato com a Bíblia. Mais: descobriram diversas similaridades entre a história dos judeus bíblicos e a deles própria; a mesma condição de expatriados, as mesmas desigualdades, a espera do retorno à pátria, um salvador iminente e assim por diante.


Etiópia: a origem da civilização cristã

George Liele já possuía algum conhecimento sobre o etiopianismo, teoria embasada na Bíblia que diz serem a Etiópia e a raça negra a protocélula da civilização cristã. As diversas traduções disponíveis da Bíblia e as muitas interpretações a que se permitem tornam a questão um poço de dúvidas. A cada conquista árabe ou européia na antiga África mudavam-se os nomes dos territórios. Assim, as origens da civilização etíope confundem-se no passado com a de Kush ou Méroe, Núbia e até do Egito. Segundo os gregos, o antigo Egito era habitado pelas mesmas tribos da antiga Etiópia, indivíduos de pele negra e cabelos como lã (4).
A Igreja Batista tornou-se um canal de reclamos para os escravos. Os pastores batistas exortavam os negros à resistência e foram os primeiros a clamar em favor da descolonização e citar a frase, hoje enciclopédica, “África para os africanos”. O sincretismo entre as imagens e valores bíblicos e afro-jamaicanos foi uma conseqüência lógica nesse processo.
Mesmo após a abolição da escravatura, em 1838, a insatisfação na ilha era generalizada. O apego à fé e às lideranças político-religiosas foi responsável por uma série de rebeliões. O sincretismo catalizou-se em 1860 com o revivalismo, quando a religiosidade e o espiritualismo foram levados a extremos, num episódio sem precedentes na história da Jamaica.
No começo deste século, amparados num movimento nacionalista, alguns pregadores lançaram mão de sua influência e retórica para mesclar elementos bíblicos e da teoria etiopanista com reivindicações de cunho social e político. O mais destacado de todos eles era o jovem Marcus Mosiah Garvey. Após liderar movimentos grevistas e revelar um enorme poder de comunicação junto às massas, garvey fundou a UNIA – Universal Negro Improvement Association (Associação Universal para o progresso Negro) – uma das primeiras tentativas de peso realizadas para a garantia dos direitos dos negros no mundo ocidental. Para que se tenha uma idéia, somente entre 1914 (data da sua instauração) e 1920, a UNIA chegou a agregar quase seis milhões de membros, espalhados por todo o mundo.

Ascensão de Selassié

Em 1916, Marcus Garvey viajou para os Estados Unidos com o propósito de apresentar propósitos educacionais para Washington. Terminou instalando-se nesse país e, sempre estimulando o retorno dos negros à África, fundou a Black Star Line (Companhia Estrela Negra) de navegação para garantir o comércio do novo mundo negro e simbolizar a repatriação. Durante os anos 20, ganhou tal eminência junto às comunidades negras dos EUA que o governo daquele país, acuado pelas constantes insinuações do jornal da UNIA, Negro World, expulsou-o em 1928.
“Olhem para a África. Quando um rei negro for coroado, a redenção estará próxima.” A afirmação de Garvey em seu retorno à Jamaica foi tomada como uma profecia. A vinda do messias haveria de pôr fim aos sofrimentos e amarguras daquele povo, crente de ser a extensão (in)fausta dos judeus das escrituras. Em 1930, Ras Tafari Makonnen foi coroado imperador da Etiópia. Adotou o nome de Hailé Selassié I e adicionou os títulos de Rei dos reis, Senhor dos senhores, Leão Conquistador e Tribo de Judá, Eleito de Deus e Luz do Mundo. Seguidores de Garvey acorreram à Bíblia e, entre outras passagens, encontraram em Apocalipse 19, 16: “Sobre o manto e sobre a coxa está escrito seu nome – Rei dos reis, Senhor dos senhores”, e Apocalipse 5,5: “Mas um dos anciãos me disse: Não chore, eis que o Leão da Tribo de Judá, a raiz de Davi, venceu para abrir o livro e os sete selos”, que descreviam o messias em seu retorno. Para alguns pesquisadores, Selassié era o 225º representante da linha salomônica, advinda da controversa união do rei Salomão com a rainha de Sabá. A analogia, pois, foi rápida e contundente: Hailé Selassié é o messias. Os acontecimentos históricos que se sucederam na Etiópia passaram a ser relacionados com as escrituras, consolidando a suposta divindade do imperador. A invasão do país pelas tropas de Mussolini e a heróica resistência do povo etíope comandado por Selassié, por exemplo, encontram-se registradas em Apocalipse 19, 19: “Vi a besta e os reis da terra com os exércitos reunidos para fazerem guerra àquele que montava o cavalo e a seu exército”. A trágica epopéia dos negros jamaicanos, os sentimentos nacionalistas, o etiopanismo, o sincretismo afro-bíblico, os clamores pela volta à África ganhavam, enfim, um direcionamento, um objeto de adoração e esperança. O nome batismal do imperador, Ras Tafari, rotulou a fé que lhe era dedicada. O movimento explodiu. Durante uma conturbada visita à Jamaica em 1966, Hailé Selassié negou ser o salvador (Jah, para os rastas), mas não foi ouvido.
O rastafari foi inescrupulosamente manipulado por falsos líderes ao longo dos anos 30, 40 e 50. os projetos econômicos e educacionais instituídos por Marcus Garvey na década de 20 soçobraram juntamente com os navios imprestáveis comprados de armadores brancos a preços de mercado negro (5). O profeta, aliás, morreu miseravelmente em Londres, no ano de 1940. As aziagas situações em que se viram atirados os rastas, a violência insuflada por interesses pessoais de alguns e a inadvertida relação com os rude boys (6) na década de 60, ao contrário do que seria presumível, fortaleceram os ideais legitimamente rastas, outorgando aos seguidores contemporâneos uma doutrina mais realista e urbana, sem abrir mão de seus preceitos dogmáticos.

Os caminhos da redenção

Os rastas somam hoje 10% da população jamaicana, estimada em 2,5 milhões de habitantes. Malgrado a morte de Selassié, em 1975, adoram-no ainda, como um ente de vida perene. Estão espalhados em todo o país, invariavelmente em guetos onde grassam a miséria e práticas de subsistência. Afora algumas facções misantropas, integram-se à sociedade como músicos, soldadores, motoristas, pescadores, artesãos e agricultores. As crianças, com raríssimas exceções, não vão à escola, “centros de lavagem cerebral e maus ensinamentos”. Seja por hábitos, palavras ou aparência, os rastas são facilmente identificáveis.
O rastafari é pró-Cristo e anti-papa. Reconhece a Igreja Católica Romana, mas vê no papa a personificação do Satanás, por liderar aqueles que fazem das verdades da Bíblia recurso de dominação de seus seguidores. O totalitarismo das grandes potências e as muitas formas de exploração do homem são, para os rastas, garantidos pela Igreja e seus falsos pregadores; a destruição disso tudo está próxima, e somente os que seguem os ensinamentos da Bíblia, os justos dos justos, serão poupados. A Bíblia, pois, é companheira inseparável dos rastas. Guiando e iluminando os caminhos que hão de leva-los à redenção.
A linguagem rasta possui particularidades que vão desde a descaracterização do inglês, a língua oficial jamaicana, até o encampamento de termos do amárico etíope e de origem crioula. A sabedoria discursiva resume-se no conceito de word (razão), sound (fala) e power (coração). Aos não iniciados, o patoá é incompreensível. A palavra I (literalmente, “eu”) concentra inúmeros predicados de interação divina e, conseqüentemente, desmedidas utilizações. Tudo que converge no sagrado inicia-se com I. Daí termos Itation para meditation (meditação), Ivine para divine (divino) e assim por diante. Nos lábios dos rastas o inglês transforma-se. Brother, cuja pronúncia aproximada é “broder”, soa “broda”, e até o famigerado “th” de the, thing ou them, de inexorável dificuldade para a pronúncia latina, simplifica-se no som cru e direto do “t” ou “d”, criando “ting” para “thing”, “dem” para “them”, etc.



Através de suas canções, Bob marley popularizou os rastas no mundo.



Os costumes dos rastas

Os hábitos alimentares dos rastas são basicamente vegetarianos. A justificativa, como sempre, é bíblica: “ e a todos os animais da terra, a todas as aves do céu e a todos os seres vivos que rastejam sobre a terra, eu lhes dou os vegetais por alimento” (Gênesis 1, 30).
Abominando, além da carne, alimentos como ovo, queijo, pães, e massas de farinha branca, os rastas mantêm-se com uma variada gama de frutas e hortaliças encontradas na Jamaica. Arroz, feijão, ervilha, mandioca, coco, banana, mamão, abacaxi, laranja, ackee (a fruta típica da ilha), pimenta, batata e uma infinidade de sucos e extratos compõem a mesa do rasta no dia-a-dia. A bebida alcoólica é evitada, bem como os refrigerantes e enlatados de qualquer tipo. Plantar o que come, quando possível, é o ideal.
A alimentação rasta é comumente chamada Ital, termo oriundo de natural e vital. Na urbana Kingston, por exemplo, onde as dificuldades em se encontrar a comida Ital se pronunciam, existem restaurantes especializados em prepará-la, normalmente dirigidos por rastas. Os preços são acessíveis e acabam atraindo todos aqueles que precisam se alimentar bem sem gastar muito.
A Bíblia diz, em Números 6,5: “Enquanto durar o voto de nazireado a navalha não passará sobre a cabeça; estará consagrado enquanto não se completarem os dias que consagrou ao Senhor, e deixará crescer livremente o cabelo”. Por isso, a grande maioria dos rastas jamais corta o cabelo e a barba, que se tornam, ainda, “antenas” de vibrações divinas.
As dreadlocks (literalmente, “tranças horrendas”) surgiram por volta de 1935, inspiradas em fotos de guerreiros massais e somalis da África Oriental. A idéia corrente de que sejam sujas, nunca lavadas, não é verdadeira. Uma espécie de touca de lã, a tam, guarnece a dreadlocks do sol e do vento e é, quase sempre, tecida nas cores etíopes: vermelha, amarela e verde. Se nas ruas de Kingston um rasta for insistentemente fitado por um turista curioso, certamente arrancará de um só golpe a tam, expondo as dreadlocks num ato de afirmação de sua negritude e crença.
Os próprios rastas costumam recitar: “nem todos os rastas usam dreadlocks, nem todos que usam são rastas”. Sem dúvida, a popularização do uso das dreadlocks, na Jamaica e no mundo, deu margem às más interpretações sobre os rastas, num processo errôneo de correlacionamento. Mais importante que as dreadlocks, afirmam, é ser rasta no coração.
De todos os hábitos rastas, o mais problemático, o mais suscetível a implicações sociais e até legais é o consumo da marijuana, conhecida popularmente como ganja (7), a erva sagrada. Fumar ganja é um sacramento, comparável à hóstia ou ao incenso na Igreja cristã. Em Gênesis 1, 29, encontra-se: “Deus disse: Eis que vos dou toda a erva de semente , que existe sobre toda a face da terra, e toda a árvore que produz fruto com semente, para vos servir de alimento.”, o que para eles é a aclamação suprema do ato. Sob o efeito entorpecente da ganja, os rastas dizem manter íntima relação com divindades, unidade com o mundo e raciocínio lógico. É indispensável durante meditações, cânticos e orações. Na forma de chá, é utilizada para relaxar crianças pequenas que choram muito ou se mostram tensas. Inúmeros pratos da cozinhas fazem uso da erva, também usada contra males do corpo, como infecções, febres e dores de cabeça.
Não se sabe quando a marijuana chegou à ilha ou até se já existia antes do descobrimento, mas é certo que ela se encontra na ilegalidade desde 1913. Os problemas com a polícia foram sempre marcantes, mas, atualmente, existe uma relativa conivência para com o porte e consumo em pequenas quantidades. Ainda assim, flagrar um rasta com a erva é sempre um bom motivo para os policiais lhe cobrirem de cusparadas e impropérios (8). O rastafari encontra-se intrinsecamente relacionado com a música. Em Salmos 18, 50 lê-se: “Por isso, Senhor, te darei graças entre as nações, entoando hinos a teu nome”.
Através dos anos e das progressivas evoluções dos ritmos jamaicanos, a mensagem rasta foi cantada na lida diária, nas praias, mas clareiras escondidas das Montanhas Azuis (no interior da ilha), nas favelas e palcos mambembes. A música é hoje o mais importante veículo de pregação rastafari e reivindicações sociais. Basta citar o reggae, mundialmente conhecido, para se ter uma idéia do casamento entre ritmo, melodia e doutrina fomentados pelos rastas. A base de tudo são os tambores burru, tradição rítmica africana difundida nos tempos da escravidão e adotada pelos rastas como nyahbinghi drums.
Os rastas reúnem-se constantemente para cantar, para louvar Jah, com tambores e ganja na mão. O ritual é conhecido como grounation e ilustra todas as datas importantes do calendário rasta. Dificilmente a presença de um estranho é tolerada nessas ocasiões, tal a importância e mística que lhe são atribuídas.
O rastafari conquistou espaços na sociedade jamaicana inimagináveis há alguns anos. Embora muitos recusem-se a votar, nenhuma campanha política prescinde da inclusão de seus problemas, tal é a força do movimento junto à opinião pública do país. Está gravada na história da Jamaica a imagem do primeiro-ministro branco, Edward Seaga, unificando os brados de “Jah, rastafari!”, durante os funerais de Bob Marley, um rasta que levou, através de sua música, a realidade jamaicana às primeiras páginas dos jornais em todo o mundo.
É inegável que algumas aspirações rastas, como a volta à África, constituem hoje apenas simbologia doutrinária. O apartheid na África do Sul, a conturbada situação política no Zimbabwe e a fome na Etiópia são, para eles, exemplos da espoliação exercida no continente pela Babilônia. Além de impraticável, o êxodo seria insensato, crêem.
Aninhados sob o sol enérgico da Jamaica, esperam tranqüilos a chegada do Apocalipse. Têm certeza de que sobreviverão. Seu canto mavioso e as palavras de sabedoria, como na lenda milenar do rouxinol, mantêm vivo o imperador e distantes os fantasmas das más ações que cometeu.




Notas

(1) Rastafarianos. A utilização de rastas, tão-somente, é corrente no inglês e parece-me mais adequada. Da mesma forma, prefere-se rastafari ao termo rastafarismo ou até rastafarianismo. Os rastas detestam "ismos".
(2) Os próprios rastas aconselham o uso dos termos "movimento", "doutrina", "fé", mas nunca religião.
(3) Barret, Leovard. Soul Force. Nova York, Doubleday, 1974, p.77
(4) Whitney, Malika Lee & Hussey, Dermott. Bob marley, Reggae King of the World. Nova York. E,P. Dutton, 1984, p.114
(5) Ramchand, Kenneth. O sonho africano de Marcus Garvey", in O Correio da Unesco. rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1982, p.42
(6) Responsáveis por uma onda de violência e vandalismo ocorrida na Jamaica durante os anos 60 e parte dos 70. Oriundos do campo, chegavam à capital, Kingston, não conseguiam emprego e se marginalizavam. Alguns adotaram as tranças rastas, daí ter surgido muita confusão.
(7) É o termo mais usado. São ainda de uso corrente os nomes sinsemilla, herb, hola herb, lamb's bread, Ishence, kaya, weed of wisdon e kings bread. A quantidade de nomes equipara-se à do produto.
(8) Vez por outra, um músico é preso por causa da ganja, Assim, a polícia espera fazer reconhecido seu trabalho. Ficaram famosas as prisões de Bunny Wailer, Peter Tosh, Toots Hibbert e, há pouco, Gregory Isaacs.


Matéria da próxima semana: "Quem foi Caim?"

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terça-feira, 4 de março de 2008

Revista Planeta


Na minha casa sempre houve uma variedade de livros e revistas novas e antigas, que ficavam guardadas em umas estantes às quais eu tinha livre acesso. Foi aí que encontrei uns exemplares de uma revista que apresentava uns assuntos estranhíssimos: sociedades secretas, ufologia, conspirações, temas de esoterismo e ciências ocultas. Creio que as revistas pertenciam a uma tia minha metida a esotérica e que por vezes enviava alguns livros e revistas à minha mãe. Nessa época eu devia ter uns 10 anos de idade.
Anos depois eu comecei a me interessar por tais assuntos e, para minha surpresa, encontrei na banca da minha cidade aquela mesma revista, que eu achava que nem era mais publicada. Nos anos 90 aconteceu uma febre esotérica no Brasil (creio que no mundo todo), com modismos por gnomos, magos, bruxas, anjos... E foi nessa época que comecei a comprar a Planeta, que leio até hoje.

Pra quem não conhece, a Planeta pertence à Editora Três (que também publica a Isto É), e existe desde 1973. Deve ser uma das revistas mais antigas ainda editadas no Brasil. Nasceu inpirada em uma publicação francesa, a Planète, criada por Louis Pauwels e Jacques Bergier, que tinha por característica tratar de temas pouco convencionais e ausentes da mídia, com um espírito de contracultura e livre-pensamento. A original francesa durou pouco tempo, mas a brasileira persistiu, embora hoje ela seja bastante diferente de quando ela surgiu. A linha editorial mudou bastante ao longo do tempo. Hoje suas matérias são centradas em temas como preservação ambiental, bem-estar, turismo e pluralidade cultural. Vez ou outra, alguma matéria sobre meditação e espiritualidade. Desconheço o motivo dessa mudança, pois a revista perdeu muito de sua identidade. Apesar disso, continuo lendo-a, pois ela ainda tem muita coisa interessante e uma aura envolvente. (Tenho até uma comunidade no orkut chamada "Eu leio a revista Planeta").

Vou começar a postar, uma vez por semana, aqui no blog, matérias antigas da Planeta, dos anos 70, 80 e 90 (tenho várias edições antigas adquiridas em sebos). Será uma forma de disponibilizar na internet algumas dessas matérias, pois elas ainda não se encontram na rede e certamente possuem uma riqueza muito grande. Começarei amanhã, com uma matéria sobre os Rasta. Quem quiser ler matérias atuais da Planeta, pode acessar o site da revista.






Capa de uma antiga (anos 70, com formato diferente) e da edição atual de Planeta.


segunda-feira, 3 de março de 2008

Meme - Verdade ou conseqüência

O Felipe, do Blog do Bonomi, me convidou para um "meme" (o que significa essa palavra eu não sei). Isso quer dizer que devo responder 10 perguntas feitas por ele, ou então cumprir o desafio que ele propôs (fazer um post super bacana falando bem do Bonomi e ainda postar uma foto sua segurando uma folha de caderno com os dizeres “Bonomi é o melhor”!). Ele ainda deu a opção de ignorar o tal meme. Como nunca fui convidado para isso, vou responder as perguntinhas dele.


1 -Por que resolveu criar o blog?
Bem, eu precisava achar uma ocupação, porque estava em férias e tentando para de fumar. Para não pensar em cigarro, precisava ocupar os pensamentos com outra coisa. E deu certo, pois estou há mais de um mês livre do tabaco. Além disso, eu queria intereagir com outras pessoas por meio de meus textos, e o blog foi o canal perfeito para tanto.
2- O que te dá mais prazer em blogar?
Saber que pessoas dos mais variados lugares tomam conhecimento de minha existência e de meus textos por meio dele.
3- Por que você deu este nome ao seu blog?
Porque minhas idéias oscilam entre a beatitude e a obcenidade.
4- Quanto tempo por dia você gasta com seu blog?
1 hora
5- Indique um blog que você considere bom e explique o porquê da escolha.
"Humano, por enquanto", do Johnny Farias. É um blog que eu acesso pela qualidade dos textos, com cujas idéias tenho afinidades e falam-me sempre à alma.
6- Quanto tempo durou a Guerra dos Cem Anos?
7- Qual era o primeiro nome do Rei George VI?
8- Se tivesse a oportunidade de conhecer uma pessoa famosa a sua escolha, qualquer uma, quem escolheria? Por que?
A Madonna, porque sou fã dela, considero-a uma artista incrível, além de ela ser uma lenda viva.
9- De onde vem a groselha chinesa?
10- Do que é feita a escova de pêlo de camelo?
Não sei, nunca vi uma...


Tá, agora que eu respondi, eu tenho que escolher 3 blogs para os quais passarei 10 perguntas e um desafio. (Isso vai dar trabalho...)
Desafio: comentar todo os posts do meu blog.
Opção: ignorar (boa a idéia do Felipe, pois ninguém merece sentir-se forçado a fazer algo).


Blogs escolhidos:


Perguntas:
1 - Por que resolveu criar o blog?
2 - O que te dá mais prazer em blogar?
3 - Há algo que te irrite no mundo dos blogs?
4 - Porque você deu este nome ao seu blog?
5 - Quanto tempo por dia você gasta com seu blog?
6 - Indique um blog que você considere bom e explique o porquê da escolha.
7 - Qual foi o tempo máximo que ficou sem criar novos posts desde que você criou o blog?
8 - Já teve vontade de abandonar o blog? Por que?
9 - Indique um livro, um filme e um disco.
10 - O que acha desse tipo de meme?

domingo, 2 de março de 2008

Ouvindo... Baby Consuelo




Algo que aprecio muito é conhecer a obra inteira de um artista. No caso da música, isso significa percorrer toda a discografia de algum cantor ou grupo. Na primeira vez em que fiz isso, eu era ainda adolescente: fui comprando todos os CDs da banda Legião Urbana e também os trabalhos solo de Renato Russo. Isso levou algum tempo, pois eu não tinha dinheiro para comprar mais do que um CD por mês, além de ser difícil de encontrar os discos mais antigos (onde eu morava nem havia loja especializada em discos). Hoje, com a internet, é algo bem mais fácil: basta procurar um link e fazer o download do álbum desejado.
Atualmente, estou explorando a discografia de uma cantora muito controvertida, a começar pelo seu nome: outrora Baby Consuelo, hoje Baby do Brasil. Ela começou sua carreira junto ao grupo Os Novos Baianos, em 1969, no qual permaneceu até o final de década de 70, quando iniciou sua carreira-solo. Esse grupo marcou época na música brasileira, tanto pela musicalidade quanto pelo estilo e pela filosofia de vida: remanescentes do movimento hippie, viviam em uma comunidade com ares anárquicos. Em sua carreira solo, Baby preservou algumas das características do grupo: fundia em suas canções elementos do rock com elementos de várias vertentes da música popular brasileira. Na década de 80, tornou-se adepta de uma corrente esotérica liderada por Thomas Green Morton, que passou a influenciar seu repertório e seu visual, cada vez mais exótico. Finalmente, tornou-se evangélica e hoje canta apenas música gospel.
Dos discos que já ouvi de Baby, meu preferido pode ser considerado seu último álbum de verdade: "Sem pecado e sem juízo", de 1985 (ano em completei 5 anos de idade). Depois desse, ela lançou apenas alguns trabalhos, digamos, menos interessantes. "Sem pecado e sem juízo" é impregnadíssimo pelo esoterismo de Baby. Até na capa aparece a palavra divulgada por ela como tendo poderes mágicos, o famoso "rá", que em algumas músicas ela também repete. Ainda na capa, ela aparece usando garfos entortados como colares (seu mestre espiritual alegava ter poderes paranormais e entortava garfos com esses poderes). Nas letras das canções, ela fala de experiências místicas, energias cósmicas, mas também de sensualidade e paixão. E as músicas transitam entre baladas pop, rock com abuso de solos de guitarra (à la Pepeu Gomes), e ritmos nordestinos, numa salada que resulta muito interessante e é completada pela voz doce de Baby, que a gente nunca sabe direito se está afinada ou não, mas que sempre acaba seduzindo por sua unicidade.
Vale à pena conhecer o trabalho dessa artista tão singular e que poderia ter rendido coisas ainda melhores se tivesse sido mais valorizada e bem aproveitada. De qualquer forma, ela é uma legítima representante de uma época cheia de loucuras, mas plena de vida e exuberância. Infelizmente, com sua conversão ao evangelismo ela dificilmente voltará a produzir qualquer coisa que não sejam hinos religiosos...






sábado, 1 de março de 2008

A Papisa

Ocorreu-me uma idéia que colocarei em prática aqui. Todo sábado, começando hoje, tirarei uma carta de tarô cujo significado comentarei num post. Quem acessar o blog durante a semana e ler esse post, tome para si o que esta carta tiver de premonitório para sua vida, de acordo com a interpretação geral e intuitiva que darei. Quem não crê em premonições, tome o simbolismo da carta como fonte de reflexão sobre algum aspecto de sua existência.

A carta que tirei hoje foi esta:

A Papisa é uma carta curiosa. Afinal, o posto de comandante da Igreja é restrito aos homens, logo, papisas não existem. (A não ser no imaginário lendário segundo o qual um dos papas teria sido, na verdade, uma mulher disfarçada de homem. Mas isso não vem ao caso aqui.) O que justifica que a carta de número 2 do tarô apresente essa figura com esse nome?
O número 2 está simbolicamente associado ao princípio feminino do Cosmos e do ser humano. Portanto, estamos diante de uma carta feminina por excelência. Ao denominar esse princípio como "Papisa", o tarô revela a Sabedoria e o Poder inerentes a ele. É a mãe a educadora por excelência, é por ela que todos somos introduzidos nos saberes básicos do mundo e da vida. E é desse princípío feminino presente em todos nós, sejamos homens ou mulheres, que devemos sorver a sabedoria que pode nos guiar nos momentos de confusão, de decisões importantes e de obscuridade. Na Papisa está a chave de segredos aparentemente impossíveis de serem revelados. Muitas vezes, a solução de que necessitamos para algum aspecto de nossa vida está em algo escondido, talvez um pequeno detalhe ao qual não damos atenção julgando que tal solução deva ser algo grande e chamativo. Mas as mães sempre reparam nos mínimos detalhes daquilo que diz respeito a seus filhos, e são capazes de chegar a conclusões perfeitas a partir de pequenos indícios. E é isso que as torna sábias e poderosas como a Papisa.
Espero que isso diga algo a você, caro (a) leitor (a)...


P.S. Os comentários ao post levaram-me a acrescentar esta observação posterior.
O tarô não é apenas um instrumento para adivinhação ou para saber o futuro. Esse é apenas um dos aspectos desse baralho antiqüíssimo. Nele estão representadas de forma simbólica, arquetipicamente, todas as dimensões da vida humana. Há numerosos estudos acadêmicos a respeito desse tema, entre os quais se destacam os do grande Carl Gustav Jung, que apresenta as relações entre os arcanos do tarô e os arquétipos presentes no inconsciente coletivo da humanidade. Desprezar o tarô classificando-o como mera superstição ou bobagem esotérica é, no mínimo, fechar-se ao conhecimento de um canal de transmissão de cultura ao longo dos tempos.